Em uma nota, profissionais e pesquisadores da saúde repudiam a nova publicação do Ministério da Saúde sobre aborto legal no Brasil, divulgada no último dia 8 de junho. No documento, intitulado ” Atenção técnica para prevenção, avaliação e conduta nos casos de abortamento “, consta, entre outras coisas, que não existe aborto legal no Brasil, mas sim aborto com “excludente de ilicitude”.
“Todo aborto é um crime, mas quando comprovadas as situações de excludente de ilicitude após investigação policial, ele deixa de ser punido, como a interrupção da gravidez por risco materno”, afirma o documento do Ministério. A alegação chamou atenção de especialistas e vem repercutindo na mídia nos últimos dias. Segundo os médicos que assinaram a nota de repúdio, a alegação é falsa e vai na contramão do que diz o Código Penal.
O aborto é garantido por lei em três casos: se a gravidez é decorrente de estupro, representar risco à vida da mulher ou no caso de anencefalia fetal, ou seja, quando não há desenvolvimento cerebral do feto. Por lei, qualquer hospital que ofereça serviços de ginecologia e obstetrícia deve ter equipamento adequado e equipe treinada para interromper uma gravidez nas situações previstas em lei.
DESINFORMAÇÃO
Ainda no documento, o Ministério da Saúde mostra desinformação ao dizer, por exemplo, que a curetagem uterina é um dos métodos recomendáveis para a interrupção da gravidez. O procedimento consiste em esvaziar o interior do útero com o auxílio de uma cureta, instrumento cirúrgico em forma de colher. Mas, como explicou ao iG a ginecologista Helena Paro, membro do Comitê de Aborto Seguro da Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO, na sigla em inglês), o método é considerado obsoleto e prejudicial à mulher pelas principais autoridades em saúde.
Evidências científicas mais sólidas sugerem que as maneiras mais recomendáveis de se interromper uma gravidez são por meio da aspiração intrauterina e do uso do medicamento Mifepristona, que não está disponível no sistema de saúde brasileiro.
“Como profissionais e pesquisadores da saúde, sentimo-nos no dever ético de contestar publicamente as afirmações falaciosas disseminadas ao longo do documento, principalmente as que se referem aos aspectos técnicos e assistenciais relacionados ao aborto legal no Brasil”, escreveram os médicos na carta.
EVOLUÇÃO
“Nos primórdios dos anos 1990, era compreensível que as recomendações não trouxessem uma avaliação criteriosa dos estudos, haja vista a dificuldade de acesso à internet e às bases de dados internacionais. No entanto, em 2022, não podemos aceitar um documento que não explicite o método de seleção desses estudos e tampouco avalie o nível de evidência e o grau de recomendação das condutas”, afirmam os especialistas.
Os médicos reuniram informações pouco difundidas sobre o aborto legal no Brasil com o objetivo é trazer esclarecimento à população e desmentir inverdades que estão sendo disseminadas sobre o assunto, sobretudo nos últimos dias. Veja algumas delas abaixo:
1. Sim, aborto é uma questão de saúde pública e de justiça social.
No Brasil, são mais de 200 mil internações por ano para procedimentos relacionados ao aborto, que custam, em média 40 milhões de reais por ano ao SUS. Dos 770 óbitos por aborto entre 2006 e 2015 que ocorreram no Brasil, a maioria foi entre mulheres pretas, indígenas, que viviam nas regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste.
2. Sim, existe aborto legal no Brasil.
Desde 1940, o aborto é legal nos casos de gravidez decorrente de estupro e nos casos de risco de vida à mulher. A partir de 2012, o aborto nos casos de anencefalia fetal também passou a ser legal no Brasil.
3. Aborto legal não é crime e ameaçar meninas e mulheres com investigação policial é tortura do estado.
A imposição da investigação policial para os casos de aborto legal é uma tentativa de intimidar a população e os profissionais de saúde que assistem meninas e mulheres com direito ao aborto.
4. A coleta de vestígios forenses é um direito sob consentimento da mulher.
A coleta de material biológico sem o consentimento da mulher é uma grave violação ética e de direitos humanos. A mulher também tem o direito de escolher o método de tratamento ao aborto de acordo com suas preferências e não é obrigada e submeter-se ao tratamento cirúrgico exclusivamente para a coleta de vestígios, já que a coleta não é possível durante o tratamento medicamentoso nas fases mais iniciais da gravidez
com informações do IG
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